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MISTURA DE MUNDO-TUDO



Mandengue Mandinga Quicongo

Keita Kora Koité Quimbundo

Lingalá Kimuezo Yorubá

Balafon do Mundo - Mudo.


Tambor que fala-tama

Wemba Wolof Umbundo

Rumpilé do Semba Samba

Cala o djembé do Mundo-Surdo.



Eu, índia África Sertão, escuto.

Ninguendade de Darcy

Mestiça D’Angola.

Marginal D’aqui.

Mistura de Mundo - Tudo.


Inaê Sodré

21 10 09

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DOCE SETEMBRO

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macio como colo de mãe,

eterno como um agora;

paisagem distante,

passageiro do entardecer;

oh!

essa praça vazia me fez solitário,

me fechou no espelho de tantas lembranças;

já não brinco na chuva,

já não gritam comigo;

hoje são tantos setembros

e eu sem nenhum.

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MEDO


O VIDRO, O COPO
O AÇO, A BANDEJA
O GELO, O CUBO
O ARAME
E O CORAÇÃO AMARRADO EM FIOS DE NYLON.




Por Emanuelle Chagas
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A CHUVA

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O novo barraco conquistado em um canto distante. O beijo na filha. O café da manhã. A rua descalça. A encosta do morro. Uma vereda calada. No ônibus do trampo. O rádio que fala. A notícia que soa. O trajeto que segue. A chuva. A chuva que cai. A chuva que cai e cai. A notícia que chega pelo rádio do ônibus. A Baixa do Tubo. O tubo alagado. O barraco no chão. A filha...a filha...O lençol sobre o caso encerrado. O sonho lavado em gotas de lágrimas secas de um tempo úmido. O corpo pequeno, gelado, findo sobre o chão lodoso. A lama forte soberba tomara o que era seu. A chuva continuava fria. A vereda impiedosa e voraz cantarolava um rio de desculpas para justificar sua passagem com sofreguidão. Hoje não iria trabalhar. Amanhã também não.
Por Djalma Jacobina Neto

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DON'T CRY FOR ME

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Era na esquina onde se achava o bandoneón, os olhares penetrantes, o batom carmim, Juanita Menéndez, o La cumparsita brilhando na noite baiana. Na mesa, uma figura, um tímido a esperar repetidamente, a buscar sempre a uma mulher, uma única, a que mora no tango, que nunca acha nos colos das outras, nem no fundo dos copos. Pobre Hombre, deu seu coração a uma mujer e ela o guardou numa gaveta do seu camarim.
Depois de muitas estrofes repetidas, duas paradas na noite, Juanita Menéndez com seu colo enrugado anunciou o noivado e a partida. No meio da boate, um coração parou, um corpo desfaleceu e a voz de Gardel foi estancada. Era uma figura assídua aqui na boate, se ouviu dizer.

Por Emanuelle Chagas
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BEM TE VI



Naquela manhã de sábado não havia acordado bem; uma rede de águas fluía em sua cabeça. Já não era tão assim a paz que pensava ter; as palavras lhe vinham ferinas e sem nexo. Ao lado, a mulher dormia no conforto do ar-condicionado. A vida...a vida que o tempo lhe rapinava. Filhos crescidos mundo afora e a razão perdida de ser. Ele ansioso por algo mais. O que poderia saciar aquela angústia de existir? A dor de cabeça incomodava... um analgésico já não servia; não era uma dor precisa, era uma dor do tempo. Levantou-se e cobriu a filha mais nova. Tentou se explicar pelo nada que acontecia sempre para si. Havia o amor em firulas dobradas; mola de geração ou algo de vida? Já era cúmplice da existência; contrato feito na juventude. Construíra uma vida e hoje era prisioneiro do seu próprio desconhecer no passado. Passos solenes caminhados com uma soberba ilusória. Agora ali, a espera de quê? Dor atroz, não física; uma dor de vazio, de completude vazia. Pensou em trocar o carro novo por um mais imponente. Já havia feito isso várias vezes; a que o levava a imponência do carro? Planejou, também, trocar o belo apartamento por aquele mais moderno e luxuoso...a mulher já havia lhe realçado a importância de se ter qualidade de vida. Piscina com raia, espaço fitness, brinquedoteca, movie room, espaço gourmet, solarium...Mais tarde iria ao shopping comprar um terno novo e uma jóia para a esposa; amanhã era dia das mães. Queria andar na praia...estava chovendo muito! Ligou a tevê por hábito. Notícias da chuva: alagamentos, engarrafamentos, arrastões, barracos destroçados...Um velho pedreiro chorava a perda da moradia. “Trabalho de uma vida”. Consolava-se que seu tudo era sua família; estava intacta. Deus fizera aquilo com ele. Desabafo infeliz de um momento de dor. Baixou a cabeça e remendou as palavras: clamou respeitosamente pela divindade. Talvez comprasse um Tucson igual ao do anúncio da tevê; estava um carrão. Final do ano, um cruzeiro até a Europa poderia lhe trazer a tranqüilidade. Stress de tanto trabalho. Voltou a atenção para o jornal; sob os escombros, a família soterrada de uma empregada doméstica. Móveis baratos despedaçados e a geladeira velha revirada na lama da rua do subúrbio desconhecido. Desligou a tevê e foi tomar um café. Adália estava atrasada; ainda não havia chegado para pôr a mesa...talvez devido à chuva. Pegou um iogurte, uma banana na fruteira e foi comer na mesa da varanda. No canteiro um bem-te-vi observador que cheirava as rosas denunciou sua presença no mundo e partiu alvoroçado.

Por Djalma Jacobina Neto

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Café da manhã

Primeiros raios de sol. D. Josefa já de pé preparava o café.
Patrões. Não deixava que nada faltasse à mesa para não desagradar seus patrões, que logo mais estariam ali.
De repente surgiram passos na escada àquela hora.
-Bom dia, senhora. Já de pé?
-Bom dia, Josefa; na verdade, nem dormi. Que noite péssima!
- A mesa ainda está incompleta. Não esperava a senhora tão cedo; vai querer suco ou café?
-Não sei; tanto faz. Aliás, prepare-me um chá calmante daqueles que só você sabe fazer.

Josefa notou a expressão de angústia e o rosto desfeito da sua senhora. Não era aquela criatura viva que descia as escadas cantarolando todas as manhãs. Por que mudara assim da água para o vinho? A empregada quis dar início a uma prosa, quem sabe, a patroa triste desabafasse, mas se conteve; não ousaria tamanho atrevimento. Na cozinha, tentou ligar os fatos em seu pensamento: enquanto vivia sua insônia na madrugada, Josefa ouviu passos ligeiros e desesperados no corredor e depois gemidos abafados. Sentiu que sua senhora sofria. Brigaram?! Não podia ser. Como?! Não houve discussão entre eles naquele quarto, ia com estes questionamentos quando se dirigia à sala levando na bandeja o precioso líquido para a sonâmbula.
Sala principal. Ela, debruçada sobre a mesa, tinha os olhos fixos na cesta de frutas. A ultima vez que mergulhara numa tristeza foi quando soube que não poderia dar ao marido um filho tão sonhado. Seria o fim do casamento? Ele, frente ao imenso espelho, dava os últimos ajustes na gravata.
Assim que serviu sua senhora Josefa virou-se para cumprimentá-lo:
-Bom dia ,senhor.
-Muito bom dia dona Josefa Maria, respondeu sorrindo, enquanto ajustava sua gravata de seda.
-Hoje vocês me surpreenderam tão cedo. Volto já com o café.
-Tudo bem. Hoje não tenho pressa, disse ele.
O marido resolveu sentar-se na cadeira do outro lado da mesa, ficando de frente para a mulher. Aquela distância impedia que esboçasse qualquer espécie de contato físico com ele.ali estaria seguro. Quando ergueu a cabeça,viu-a com o olhar agora fixado nele, e a sua mão direita mexia a xícara do chá ainda quente; talvez esse fosse seu ultimo recurso: o olhar. Mirava-o insistentemente como se ainda cobrasse dele: “vim em busca de amor”, mas ele continuava indiferente a tudo. Saboreava torrada.
O silêncio da sala tinha clima de velório, e a imagem daquela estatua viva diante dele o sufocava. Não suportou aquele ambiente e gritou Josefa para trazer o jornal. Enquanto o café não chegava, ele folheava as páginas, sem interesse; na verdade, não queria ler, a sua intenção era esconder-se naquele amontoado de papel. Como um flash, a cena dos dois na madrugada dominava seus pensamentos. Era uma guerra silenciosa.
Não suportou mais: o homem se levantou, verificou as horas e deu a última sacudida no terno. Resolvera não esperar o café. Precisava abandonar aquele espaço hostil; então tomou à pressas a pasta que estava sobre o sofá e se dirigiu à porta. Puxou a maçaneta, mas, antes de ganhar a rua , parou. Como dizia um velho amigo:”fazemos muitas paradas na vida”. Depois de remexer seus pertences, retirou um bloco de rascunhos e voltou ao assento da mesa. A mulher ainda tinha esperança. Ansiosa, viu seu marido escrever uma frase curta com letras bem expressivas , destacar a folha e deixar sobre a mesa o bilhete que dizia NÃO ME ESPERE PARA O JANTAR.
Por Alex Silva
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O UNIFORME



Até que enfim havia chegado seu novo uniforme; agora ele já era um tenente-coronel! Pensava consigo mesmo que seus cinquenta e cinco anos credenciavam-lhe a um pouco de vaidade na véspera do galarim militar. Pegou a farda nova pelo cabide e a dependurou no puxador da porta fechada do armário. Abriu a gaveta do passado e de lá retirou sua antiga e primeira vestimenta na caserna; ainda um reles tenente. Era assim naqueles tempos: chegava continente no quartel incontinente, orgulhoso da pátria, da vida, da carreira. “Passado augusto!” – pensou. Pendurou a farda velha na outra porta do armário; as duas perfiladas. Ele, de cueca, sentou-se pensativo e observador na poltrona que ficava na extremidade oposta do quarto. Enquanto mirava, absorto, os dois trajes, refletia. O país não era mais o mesmo; mudara de cor, de gente, de roupa, de moral. A farda velha tinha a tez desbotada de uma época de marcha dura. Tempo de farda, de pulso, de força. O uniforme recém-chegado era garboso, cheio de botões burocráticos e democráticos de um quartel digital e contido; os galões que enfeitavam os ombros se pareciam até com os das figuras manietadas de um vídeo game online. Olhou para si, para a cueca; precisava comprar uma nova para usar amanhã na parada do Sete de Setembro.
Por Djalma Jacobina Neto
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Sem espelho
(Esboço de uma teoria do humano sem alma)


Prezado senhor Jacobina,



Esta carta eu sei que não receberá. Não chegará em suas mãos por já não estar mais nesse mundo, e tampouco a receberia se ainda lhe restasse para além de seu corpo uma alma. Não lerá, portanto, as idéias que lhe são uma contraposição. Faço, desta forma, como o senhor faria e fez quando teve oportunidade de discurso. Não é vingança, creia. Gostaria apenas de registrar e perpetuar um discurso de conteúdo filosófico, mas de procedimento dogmático. Nesta carta, concentro pedaços de pretexto para minhas reflexões tomarem acento em tinta e papel. Não usurparia muito de seu tempo, se chegasse a lê-la.
Em primeiro lugar, suas idéias me chegaram pela boca de meu pai que as obteve de seu avô, meu bisavô, que por sua vez lhe foram legadas diretamente de um tio avô. Este homem presenciou seu discurso acerca da alma humana, e embora talvez eu não o conheça de modo fidedigno, considerando essa trajetória oral, arrisco-me ainda assim a contrapor-me às suas posições. Para tanto, o farei de modo análogo. Contarei uma história. Não-factual, contudo, porque não creio que os fatos sejam tão importantes quanto as descrições que fazemos deles. A essa altura, sei que estaria curioso para ler. Segue abaixo minha narrativa.

O que a metafísica ocidental nos legou foi um punhado inútil de supostos postulados a respeito do mundo sensível. Ela almejava falar do mundo de modo separado e determinador dele. Se dizemos que alguém é belo, a metafísica julgava ter a propriedade desse belo que se aplica ao substantivo em questão. O belo, nesse sentido, é também uma substância. Algo para além das nossas atribuições, que na verdade já está nas coisas independente de nossa visão acerca dela.
Com o dualismo das meditações metafísicas cartesianas eu/mundo, sujeito/objeto, que o senhor deveria conhecer bem, a alma ganhou uma notoriedade espetacular, pois tornou-se necessária. Cabia aos filósofos, a partir de então, investigar sua natureza, mas não a sua existência. Dentre as inúmeras descrições a respeito da alma humana surgiu a do senhor. Uma curiosíssima descrição, confesso, pois me parece mesmo uma antecipação de Freud, um pensador que não conheceu. Sua concepção de duas almas: interior e exterior não é muito distinta da concepção de ego e superego freudianos. Uma que diz respeito a como se conceber em sua relação consigo e a outra em sua relação com os outros. Na medida em que somos seres sociais, sua teoria, assim como a de Freud, me parece muito palatável.
O único problema, na minha opinião, é seu resquício metafísico. O termo alma, senhor Jacobina, é derivado do latim anima. É exatamente isso que o senhor pensaria se lesse estas palavras. Alma, desde Aristóteles, é o que anima certos seres, os chamados animais. Os seres inanimados, por sua vez, são as pedras, os mares, as nuvens etc. Ela possui um caráter determinador e subjacente. E graças à alma o homem é um ser superior a todo o resto. As descrições filosóficas que se utilizam do termo alma possuem todas resquícios metafísicos, na medida em que preservam a distinção entre eu e mundo. Alma é o que capta o mundo e que nos garante uma unidade, como queria Parmênides com seu Uno, diante de todas as diferenças que nos são impostas. É a alma que lhe permite dizer que o senhor se chama Jacobina, é um intelectual e tem uma teoria sobre a alma. Sem ela, o homem seria apenas uma rede contingente de crenças e desejos. Todavia, é exatamente isso que eu penso.
Não acredito que sejamos mais do que um feixe de impressões e idéias ou uma rede de crenças e desejos. Coisas das quais são preenchidas de mundo e não se separam dele nem mesmo para olhar para si. O que me faria pensar que tenho uma alma, algo mais profundo, mais significativo, mais determinador de mim do que meu córtex cerebral seria apenas minha maneira de lidar com minha própria finitude. Quem teve acesso a Darwin, a Marx, a Freud, a Jaques Monod, a Borges e, principalmente, a Richard Rorty não está tão disposto a se crer como algo superior ao mundo. Antes se vê como fruto do acaso. E a toda análise de si como algo contingente, sem essência, sem profundidade, sem destino, sem alma. Apenas como dotados de imaginação. A imaginação que lhe serviu para traçar um esboço de uma nova teoria da alma humana, e que me serviu para nega-la.
Alma, para mim, é algo que não precisamos ter, caro senhor Jacobina. Nada está para além de nossas relações sociais, morais ou para além de nossa imaginação. Da mesma forma que sua alma exterior se agarrou à imagem do “senhor alferes”, não posso dizer, por exemplo, de Alberto Caeiro ou de Mersault a quem nada se agarraram. Falar da alma humana, meu caro senhor, é falar de algo que todos devemos possuir independente de nossa situação social, moral, econômica, cultural. Ou seja, é falar do que não podemos.

Esperaria convencer-lhe e aguardaria respostas. Confesso que, depois de refletido, o pensamento parece ser um pássaro desesperado lutando na gaiola pela liberdade. É terrível a dor de mantê-lo preso. Minha carta sem destino, no fundo, só me serve de desânimo. O problema de escrever é que sempre se pressupõe que a afirmação desta atividade não pode ser feita por quem faz, mas pelo outro. No entanto, e quando esse outro pertence a outro tempo que não o meu? Por fim, mesmo sendo nós dois dogmáticos, adoraria conversar com o senhor.

Por Tiago Medeiros
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Lutando limpo



Depois daquela refeição gostosa, há aquela coisa chata para fazer. Vi a faca emporcalhada de manteiga, o coador cheio de borra e muito farelo de pão na mesa nua e sabia quem me esperava. Sempre me perguntei qual seria a razão de usar toalha de mesa e por que pão de sal esfarela tanto, mas isso não importa agora. Pois é, eu adoro comer, mas, sempre que acabo, fica aquela sujeira desagradável. Pior ainda é limpar a minha própria sujeira. Como eu odeio lavar prato!
Já na cozinha, de frente para aquele adversário chato de derrubar, me preparo para o combate. Dava até para ouvir o locutor nos apresentando para a platéia que me observava com atenção: “Do lado esquerdo, pesando 57 quilos e usando um pijama azul, Roque ‘El Lavador’ Borba! Do lado direito, pesando 80 quilos e usando calções de aço inox, Piah ‘Aguaceiro’ Tramontini!”.
Só de pensar nisso, me deu vontade de socar o pretendente à Lombardi antes de partir para a minha luta. Comecei o embate. Ele lutava sujo, mas eu era um lutador ensaboado. Parti para cima do adversário sem dó. A cada jab com a esponja cheia de detergente o deixava mais atordoado. Quando apliquei o gancho do desengordurante, ele foi à knock out. Venci, derrotei e me consagrei. Eu continuo mandando. Sou o dono da casa, que a sujeira insiste em tomar. E que venham a revanche e os desafiantes.


Por Mário Fausto
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Testamento


Para alguém que não sei
Deixo um toque de atabaques, um solo de Miles outro de Coltraine.
Um arco íris negro, minha foto de árabe, outra dos Filhos de Ghandy
Ao Nelson Maca deixarei um verso inacabado, que possa ser reescrito
Com cantos novos do HIPHOP pintado nas paredes da Lapa
Pelos sprays de Tito Lama, Marcos Costa
E que a poeta Vida fale no páteo interno
Com a ajuda do coro dos loucos
E louco como talvez seja, deixo ao Maurício
Um terno desses que uso nas formaturas
Para lá de cima vê-lo como mestre de cerimônias da esquina
Na posse da diretoria da Grã Cruz da Ordem dos Badameiros
Para todas as quem amei, meu melhor carinho
E um caderno no qual não escrevi minhas tolas impressões
Sobre cada dos seus perfeitos beijos ou desejos
Que minha cegueira não permitiu perpetuar
Aos inimigos deixo o desconforto da possibilidade
De que possa voltar e azedar suas noites atrapalhando-os na hora H
Para Horácio Daomé e a Xurica Angola
Uma pequena poupança de quiabos, melancias e mamões
Para permitir-lhes vida alimentarmente tranqüila até seus fins
Pois casa já possuem naturalmente
Aos que gostam de mim de novo poesia
Escondida deles todos esses anos, mas que reunirei num fabuloso compêndio a ser lançado ao lado de Sobô, Ymoja, Azanssu, lá do monte mais alto
Entre todos os Kavionos na Nação de DAN
E para você leitor toda completude que nunca consegui: afã
E que não contem com minha morte nem hoje nem amanhã!


Por Carlos Limeira

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Quero dizer bem dito
Como um chute na bunda do barradão
Que continuo BAÊÊÊA
E a fazer versos
Mesmo quando acham a palavra pífia
E assumo um grito que atravesse não apenas novembro
Haja vista, que maio como me lembro
É uma primavera de delírios...
Votarei com minha consciência, crença
E amo mesmo assim o vermelho
Apesar de vê-lo muitas vezes desatento
Como a menina em frente que não sorri para mim
Mas sem remorsos continuo a fazer Letras
E muitos perguntam: por quê?
Ou o que faço aqui
Coitados
(não sabem o que acontece toda sexta)
Não sabem de Clarice, Rodrigues, Lopes,
Rudival, Pámela, William, Mário, Denisson,
Andréa, Deise Lispector, Emanuelle, Laís,
Sulamita, Milena, Alessandro, Aline, Gilberto e Jamile
Presentes!
Nem do quanto aos vinte e sete se pousa um olhar na neblina...
Com meus cabelos brancos
Ando as voltas com o HIPHOP
Porque é belo e explode em simples HAPortagem
Desconsiderando o medo, a sede, a sorte
Hoje há uma crise econômica
O amanhã não deverá ferir o futuro
Como disse Chico: "apesar de você, amanhã há de ser
Outro dia"
Acredito
Pois a Terra amanhecerá depois destes versos pretensiosos
Cheia de razões para uma nova poesia.

Por José Carlos Limeira
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Saudações, caras leitoras. Como em toda semana, Romário está aqui, no canal de notícias favorito de vocês. Sabe, vocês tem de fazer tanto por nós, cuidando da casa, dos filhos e da comida para nos dar espaço para fazer o que quisermos e pensamos que com esse espaço de perguntas, vocês ficariam um pouco satisfeitas, afinal, mulher adora falar e muito. Como de costume, recebi muitas perguntas a respeito do universo masculino e me impressionei com o e-mail enviado pela leitora Reginalda Alves, que mandou diversas perguntas em uma única mensagem. Como sempre, respondi a todas elas e espero ter ajudado. Siga abaixo as perguntas e respectivas respostas:

-Por que os homens não urinam sentados?
Porque o pênis fica resvalando na latrina e isso pode causar uma infecção. Uma vez infeccionado o dito cujo, sua sagradíssima vagina também pode ser contaminada. Desse modo, conclui-se que mijamos em pé simplesmente por questão de carinho e cuidado com vocês.

-Por que os homens, mesmo levantando as tábuas, urinam fora dos vasos?
Porque o pênis não tem mira a laser. E não falamos aqui só do xixi, ok?

-Por que os homens sempre deixam um pelinho na borda da latrina?
Porque culpa da tal Lei da Gravidade.

-Por que os homens não sabem onde fica o “ponto g”?
Sabemos sim. Fingimos ignorância só por pirraça. Afinal, vocês insistem naquela “raspadinha de dente” na hora do sexo oral. Precisamos dar o troco de alguma forma.

-Por que os homens pegam vídeos eróticos sem história?
Porque filme de sacanagem não é pra ter história. Putaria é putaria, cinema é cinema.

-Por que os homens tem tesão por meninas com uniforme de escola?
Porque está cientificamente comprovado que o uniforme de colegial fica melhor em meninas do que em idosas, homens, ursos e anêmonas.

-Por que os homens querem ir pra cama no primeiro encontro?
Tradicionalismo. A primeira transa deve ser na cama. Nada de elevador, escada de incêndio ou outros lugares do tipo.

-Por que os homens vão embora logo depois de fazer sexo com a gente no primeiro encontro?
Porque o encontro acabou. Em caso contrário seria casamento. Certo?

-Por que os homens acreditam quando a gente finge que goza?
Vamos mudar a pergunta: quem é mais esperto, quem aproveita e goza pra valer, ou quem finge e não tem prazer algum?

-Por que os homens gostam de chamar a gente de “minha putinha” na hora do sexo?
Que tal “excelentíssima senhora”? Mais excitante?

-Por que os homens detestam beijar a gente quando estamos de batom?
Da próxima vez que estivermos fazendo a barba, daremos um beijo daqueles, com a cara bem cheia de espuma. Aí vocês falam se gostam.

-Por que os homens se masturbam mesmo quando são casados?
Jogo é jogo, treino é treino.

-Por que os homens estão sempre ajeitando o pênis nas calças?
Porque temos pênis. Ou vocês nunca ajeitam o peito no sutiã?

Como já disse, espero ter ajudado. Então, caras amigas, voltem para seu serviço. Um abraço do amigo Romário e continuem a acompanhar o Canal Deferente, uma ejaculação de notícias.

N.E. – Devido a uma enorme quantidade de palavras chulas nas perguntas, as mesmas tiveram de ser censuradas.


Por Mário Fausto

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Sexta

O dia amanhecerá célere
Buscarei o traje branco
Acenderei no caminho incenso
Até o café, rápido, mas denso
Destravarei cadeados e portas
Concentrado naquele carro velho
Pega bateria arranque aos troncos
Faço feitiço, força
Lavo rápido a louça
Quase não passo em frente ao espelho
Para não perder um precioso tempo
Rumo através do centro
Da cidade velha, cheia de mágoas
Até ver Oxum no meio das águas
E outros Orixá, guerreiros e doces
Cruzo através das rotas
Fechando algumas, abro outras portas
E Ondina é um grito
E o Instituto, prostituto rito
É o touro de mármore e bronze
Onde muitos passam dos seus chifres longe
E vou a trezentos e treze onde me esperam cantos
Onde me faço e sou assim tanto
E renasço pleno e sou poeta
E nos revisito, expressão e grito
E por fim é sexta:
De Oxalá
De Cássia
Da Gente
Do Texto
Do Bem
E que assim seja
Pelo semestre
Pelas Letras
E para sempre
Amém!


Por Carlos Limeira
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Da boca contrita


Esfregou os olhos com as costas das mãos, lutando para se livrar do resto de sonho que lhe pendia das pálpebras. Testou os músculos, ainda dormentes, descobrindo, sem muita surpresa, que o cansaço e as dores ainda persistiam; corria da penumbra da noite como corria da imensidão do dia. Esticou o corpo, apoiando os pés no ferro de frio perene que marcava o fim da cama, “ou ali seria o começo?” Nunca sabia de onde começavam e terminavam as coisas.
Já não era mais menina. Subitamente, a vida explodiu entre seus dedos, e sem aviso prévio passou a trilhar os caminhos de adulta. Não tardou a se machucar: Descobriu que o mundo era maior do que aquele abarcado pelos seus olhos. Para um mundo tão grande, julgou-se infinitamente pequena. A agonia e inquietação passaram a ser as únicas conhecidas que encontrava em cada esquina. Malditas esquinas, tudo tão familiar! Os caminhos que antes a conduziam, agora a aprisionavam. Os sonhos, eternos sem-terra, alojaram-se no céu estrelado de sua boca, moradia só habitável na juventude, quando o amargo dos anos ainda não contaminou tudo. Mas os sonhos eram tantos e se multiplicavam tão rapidamente que, antes que pudesse impedir, teve sua garganta ocupada, criando um embolo que lhe dificultava a respiração. Por excesso de sonhos, passou a arfar. Logo, viu os antigos companheiros de caminhada se tornarem estranhos. Em bifurcações diversas, as mãos se desenlaçaram e os olhares, quando se encontravam, não se reconheciam mais. Para onde eles caminhavam, ela não queria ir. Para o destino que traçava para si, não queria companhia. Entre o passado morto e sepultado, e o futuro ainda embrião, abriu-se espaço para a solidão.
Ela, que antes de acostumara ao dia-a-dia linear e simples, via-se impossibilitada de alimentar a vida. Desejou desfazer-se dos inúmeros cortes que teimavam em não cicatrizar, quis abandonar as bagagens, voltar a ser feto. Ela buscava esterilidade e indiferença, os astros devolviam-lhe chibatadas e queimaduras. Expulsa de si, enxergou-se retirante sem rumo, mirando todo o mundo em busca das respostas para seu íntimo. Criava unhas para cravar algo em que pudesse se apoiar, via tudo em que sempre acreditou, se desfazer em pó e nada mais; em sua íntima desordem, precia o desespero. Trilhou todos os caminhos tortos que é de direito a todo homem e mulher que nessa terra finca os pés, sem encontrar em nenhum deles o viço necessário para manter-se viva. De certeza, só as horas terríveis que passava em companhia do nada e do silêncio, a casa vazia sufocava, cheia, enraivecida. Não ousou pedir misericórdia ao Deus-pai-todo-poderoso, sentia-se indigna dos pedidos de fé, não iria confidenciar a Ele o mal-estar de sua vida, não pretendia desaponta-lo, como fizera com si mesma. Liquefez-se e entre os dedos, deixou-se escapar; ela só era, que não a pedissem para estar.
No meio de tanto barulho e confusão, sentiu o cansaço escorre-lhe dos ombros, sentiu os braços enfraquecerem e a carne das pernas tremerem, tamanho o peso que carregava. Uma tonelada de desassossego.
De batalha em batalha, o guerreiro descansa. Deitou o corpo na cama e cobriu-se displicente, não há armadura quando o inimigo só se vê no espelho. Dormiu, um sono de horas, um sono inquieto. Agora, findo o espanto do sonho, o teste da dor e já desperta, fitava o teto. Curvou o tórax sobre o corpo, em um instante da eternidade, um silvo agudo no ouvido. Girou o corpo e com um suspiro breve, tocou os pés no chão.

Por Pamela Moura
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Estação Pirajá 2



Quatro saídas; vários destinos. Lapa, Barra, Comércio, Pituba, Ondina. As pessoas se misturam, se estressam, se encontram, se despedem. Menino, mulher, homem, mendigos; cachorros. Imperialismo (x-burguer); tradicional (acarajé). Fila, fila, filas... em linha reta, triangular, em espiral, a escolha é vasta. Ônibus chegando, gente correndo. Empurra-empurra, palavrão... um conhecido!...me dei bem!”_fala um espertinho. Barra três, sete horas, já arrastando...” vou pegar esse!”_ gritou um desesperado, observadores solidários o incentivam: “Corre! Corre! Pára! Pára!Pára!”Parou. Porta do meio aberta...” Não dá mais!_ Grita um apressado. “ Eu só quero botar um pé! Botei!”A alguns metros, após sair da estação, motorista pára ônibus, abre a porta da frente, quem está pendurado no meio, vem para a frente, entra. Foi. Engarrafamento. Campinas, BR, Vasco, Bonocô, Garibaldi. Dorme-se, acorda-se, dorme-se e nada... nada de chegar ao destino...ônibus quebra, pessoas descem. Esperam, esperam e esperam... chega outro. Mais aperto
“Licença! Licença! Vai descer?! Se não vai sai!” Chega-se ao ponto final da longa viagem de vinda... agora, agora é só se programar para a volta....

Por Uilians Souza

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Estação Pirajá 1


Ouço a fala. Barulho e confusão narrados. Curioso fico com esse lugar tão longe da minha casa.
Ouço casos variados, de choros de crianças até blitz de soldados.
Onde será que fica este lugar?
Eu nunca fui lá mas, pelo que ouço, concluo:
Quem vai lá, PIRA JÁ.

Por Mário Fausto
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Campos de Morangos



Campos de morangos não são para sempre.O pensamento me veio de repente: morangos.É claro que eu precisava de morangos para o bolo.Sorri com a idéia, como se ir comprar morangos à noite fosse um prazer secreto, descoberto por mim.Quando me dei conta, estava me perfumando, escolhendo com cuidado o que vestir. Tudo para meu furtivo encontro noturno com os morangos.Saí ansiosa, sem saber exatamente se os encontraria. Se estariam maduros.Se me sorririam de volta. Se meus trocados bastariam para comprar o direito de tê-los.A caminhada pareceu mais longa do que o comum.O trajeto que eu sabia de cor, tantas vezes percorrido no mau humor matinal, no escuro no entanto parecia maravilhoso. Calçadas vazias, o vento frio, poder ouvir meus próprios passos: toda a impossibilidade da manhã floresceu para mim de noite.Tudo culpa dos morangos.As luzes do supermercado pareceram mais brilhantes do que o habitual.A noite exerce poder até mesmo ali: pessoas fazendo compras tranqüilamente; maridos sozinhos entre as prateleiras; mulheres pacientes na eterna pesquisa de preços.Nenhuma criança, nenhum engarrafamento de carrinhos.Só outros adeptos do prazer que eu acabava de descobrir, escolhendo devagar o que levar para casa.Eu no entanto não precisava escolher - logo vi meus morangos. Bonitos, vermelhos - a embalagem plástica criminosa, escondendo o cheiro deles de mim.As pessoas passavam, alheias aquela beleza.Encantadas, talvez, por uma lata brilhante de leite em pó. Ou um mamão.Um iogurte, um salame, desinfetante?Percebi, tranquila, que aquela não seria minha última ida noturna ao supermercado. São tantos romances possíveis. Essa era minha noite de morangos. Mas amanhã, quem sabe.Levei satisfeita meus morangos para casa. Sabia - antes mesmo de abrir a embalagem - que os maduros, vermelhos, estavam por cima para esconder os pequenos defeituosos, verdes, murchos. Reais.Um pouco triste, cortei todos em pedaços tão pequenos que ninguém jamais desconfiaria da imperfeição dos meus morangos.Mas a paixão é efêmera:abri o armário e ri quando percebi.Agora eu precisava era de açucar.


Por Marina Brasileiro Sant' Ana.
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O saco de balas

Começo do mês sábado ou talvez sexta, já não lembro- me, mas não importa o dia, lembro está em pé, atrás de uma pessoa que estava atrás de outra e outra, era uma fila de supermercado. Para passar o tempo, começo a folhear uma revista. Aquelas que ficam perto do caixa, juntamente com balas, goma de mascar, salgadinhos e outros gêneros, insinuando-se para todos da fila, para que sejam levados juntos às compras previamente selecionadas.
Cansada de folhear a revista, passo a escolher alguns daqueles gêneros insinuantes, pego balas, salgados e escolho outra revista, ao começar a folheá-la o silêncio que se instalava entre as pessoas na fila foi interrompido por grito. Eu quero sim! Uma criança, talvez com quatro ou cinco anos, não sei.
Conflitava com a mãe exigindo mais um saco de balas (aquelas insinuantes), a mãe resistia argumentando: Você já tem um. Mas logo a garota dizia: mais eu quero dois. E esta cena prolongou- se por algum tempo, a garotinha usava de todas as artimanhas para convencer a mãe, até a sua cartada final. Oh! Mãe compra, senão eu não te amo mais. Parei de observar a garotinha e sua mãe e voltei-me pra revista.
Por Sulamita Santana